Advogados de Guarulhos, especializados em Previdência, já estão recebendo consultas de aposentados da cidade. Muitos querem saber se estão entre os cerca de quatro milhões de aposentados e pensionistas vítimas da fraude no INSS. Pessoas que tiveram dinheiro desviado de seus já baixos valores de benefícios, sem autorização. Geralmente valores pequenos descontados mensalmente, mas que, somados, renderam pelo menos seis bilhões de reais para a quadrilha de fraudadores.
Guarulhos Todo Dia ouviu sobre esse assunto a presidente da Comissão de Seguridade Social da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de Guarulhos, Bruna de Melo Souza Teixeira. Ela disse que já aumentou a procura por informações nos escritórios de advocacia da cidade. São aposentados e pensionistas que, em primeiro lugar, querem saber se foram vítimas da fraude. Mas a advogada disse ainda que, em reunião recente na Justiça Federal, em Guarulhos, identificou casos de aposentados que já entraram com ação, inclusive com pedido de indenização por dano moral.
Segundo a Dra. Bruna, entre os que ainda não conseguiram identificar se foram vítimas da fraude, muitos têm dificuldade de lidar com o aplicativo “Meu INSS” ou o site GOV.BR, para acessar o extrato de benefícios. É esse extrato que mostra exatamente quanto o beneficiário recebeu a cada mês e todos os descontos feitos. A advogada afirma que o ideal, para evitar qualquer desconto indevido, é olhar mensalmente o comprovante de pagamento, assim como os trabalhadores da ativa acessam os seus holerites. Só assim é possível identificar um desconto indevido assim que ele é cobrado.
A importância de checar o “holerite”
Bruna Teixeira conta que foi assim que clientes do escritório dela identificaram casos de descontos incorretos já no ano passado. Inclusive os destinados às entidades associativas que se beneficiaram na fraude identificada pela investigação da Polícia Federal. Segundo a advogada, a primeira providência, no caso dos clientes do escritório, foi procurar a entidade associativa e, na maioria dos casos, foi cancelada a cobrança e o que já tinha sido descontado foi devolvido, sem necessidade de ação judicial.
Além da dificuldade com os meios eletrônicos, existe um outro motivo para o descontrole de aposentados e pensionistas em relação aos descontos nos seus benefícios. Segundo a Dra. Bruna Teixeira, quem tem um ou mais empréstimos consignados têm mais dificuldade em controlar quanto recebe do INSS. Além dos empréstimos consignados tradicionais, existem ainda os cartões de crédito consignado. São tantas modalidades e tantas taxas diferentes, que confundem os beneficiários e ajudam a provocar o descontrole das contas. Além de ser outra fonte de golpes contra aposentados. Mas isso já é outra história.
Entenda a fraude no INSS
Uma operação da Polícia Federal e da Controladoria Geral da União (CGU) identificou um esquema que envolvia entidades sindicais e associações, cadastradas no INSS para prestar serviços a aposentados e pensionistas. Várias dessas associações cadastravam beneficiários do INSS sem autorização, muitas vezes recorrendo a assinaturas falsas. A partir desse cadastramento falso, elas começavam a cobrar mensalidades associativas, sem que os beneficiários fossem informados tanto da associação, quanto dos descontos.
Os descontos eram de pequenos valores. Em muitos casos, em torno de R$ 30,00 ou R$ 40,00. O que fazia com que muitos beneficiários não identificassem ou demorassem a identificar a fraude. Mas esses descontos fraudados atingiram mais de quatro milhões de aposentados, por vários meses ou até vários anos. Por isso, o valor desviado superou mais de 6,3 bilhões de reais, no período de 2019 (quando a fraude teria se iniciado) até 2024.
Entre janeiro de 2023 e maio de 2024, o INSS recebeu um milhão de reclamações de descontos indevidos, que foram cancelados, por não terem sido autorizados. A CGU fez uma auditoria em 29 entidades associativas que tinham Acordo de Cooperação Técnica como INSS. Destas, desde 2023, 11 foram alvo de medidas judiciais.
A investigação levou à exoneração do presidente do INSS, Alessandro Stafanutto, alvo da coleta de provas da operação da Polícia Federal. Outros cinco servidores públicos foram afastados pela justiça. Depois de dias de pressão pela sua saída do cargo, o ministro da Previdência, Carlos Lupi, pediu demissão. Ele não teve o nome citado na investigação ou ligado às irregularidades, mas vinha sendo muito criticado depois da revelação de que ele já tinha sido alertado sobre os indícios de fraude há mais de um ano.
Segundo a investigação da PF e da CGU, as entidades investigadas teriam oferecido propina para servidores do INSS, para conseguir dados dos beneficiários. Intermediários fariam essa negociação. Um dos principais seria o lobista Antonio Carlos Camilo Antunes, conhecido como “careca do INSS”. As entidades usariam assinaturas falsas para autorizar os descontos. Muitas das entidades também teriam sido criadas de forma fraudulenta, em nome de “laranjas”.
Esta semana deve ser apresentado um Plano de Ressarcimento Excepcional para os aposentados e pensionistas que foram vítimas dos descontos não autorizados. A informação foi divulgada na última sexta-feira (02), depois de uma reunião da nova direção do INSS com a Advocacia Geral da União (AGU).
Todos os Acordos de Cooperação Técnica com entidades associativas foram suspensos, até que seja concluída a reavaliação de regularidade dos recursos e dos repasses de valores para as entidades. Também foram suspensos os descontos de mensalidades associativas nos benefícios dos usuários.
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