São 6 horas da manhã no Trevo de Bonsucesso, historicamente um dos pontos de pior congestionamento em Guarulhos. Ana Adriely, 20 anos, já está dentro do ônibus em direção ao Terminal Armênia. Seu destino final é o Centro Histórico de São Paulo, onde faz estágio. Ela precisa sair de casa no fim da madrugada para chegar ao trabalho às 8h, horário de início de expediente. A viagem dura cerca de duas horas, dependendo do trânsito. E “depender do trânsito” na Via Dutra em obras não tem sido fácil para o guarulhense.
Combino com Ana Adriely, ou Aninha –como costuma ser chamada, de ser correspondente por um dia, dividindo comigo via mensagens por WhatsApp como é a sua rotina diária dentro do transporte público. Ela é moradora do Jardim Ponte Alta, região de Bonsucesso, faz estágio no centro de São Paulo de manhã e estuda Geografia na FFLCH-USP (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) à tarde. Volta para casa, como a maioria dos trabalhadores, no horário de pico do início da noite.
Entre esperas de ônibus, transporte sobre trilhos e deslocamentos, Ana gasta mais de cinco horas por dia no transporte público.
A moradora do Ponte Alta pega o ônibus 354 (Lavras – Terminal Armênia) ou o 525 (Santa Paula – Terminal Armênia). “Uma situação que é absurda é o valor da passagem, muito cara (R$ 8,60), e sem nenhum conforto nos ônibus e terminais”.
Ela divide comigo a sua rotina em uma quinta-feira. Às 6h01, Ana me envia fotos de dentro do ônibus, no Trevo de Bonsucesso: “Já estou no ônibus e o pouco de trânsito já começa. Esse novo trecho que abriu no Trevo [de Bonsucesso], na minha opinião, não melhorou em nada, todo dia é esse trânsito infernal”.
A referência das fotos enviadas por Ana no trajeto é a nova alça que liga o Trevo de Bonsucesso à Rodovia Presidente Dutra, sentido São Paulo, inaugurada pela concessionária CCR RioSP em maio deste ano. A saída toma caminho por uma pista marginal até o Posto Sakamoto 2, próximo ao km 212.
O fluxo normal das viagens na Dutra neste sentido costuma ter ritmo mais tranquilo somente até a altura do Parque Cecap (km 219), onde começam os congestionamentos. Mais adiante, no Itapegica, km 225, o anda e para continua, passando pelo Internacional Shopping em direção à capital.
O trecho com lentidão fica na altura da Rodovia Fernão Dias, que faz a fronteira de Guarulhos com São Paulo e está recebendo uma das obras de viadutos da CCR RioSP. Na pista expressa, já estão sendo instalados os pedágios free flow –que funcionam sem a necessidade de praças de pedágios, tendo um pórtico de identificação com sensores. A CCR prevê o término das obras no local entre fevereiro e março de 2025.
Aninha seguiu viagem para a Armênia. Chegou lá pouco antes das 7h30 –ou seja, quase uma hora e meia dentro do ônibus. Da Armênia ao Anhangabaú, de Metrô, foram menos de 15 minutos.
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Após quatro horas de labuta durante a manhã, a guarulhense sai para tomar um ônibus em direção à Cidade Universitária, na USP. Uma das formas de acesso ao campus é a linha municipal da capital 701U-10 (Metrô Santana – Cidade Universitária).
Nossa correspondente de mobilidade urbana passa a tarde no campus: almoça, estuda e sai por volta das 18h. Da zona oeste paulistana à periferia de Guarulhos é um longo caminho, que inclui a Linha 4-Amarela cheia pelo alto fluxo de pessoas que saem dos escritórios na zona sul de São Paulo de volta para casa.
Ana Adriely chega ao Terminal Armênia às 19h e espera cerca de 20 minutos até o ônibus para casa sair. “Bom, agora é ver quanto tempo até o Ponte Alta nesse horário”, escreve ela, em mensagem enviada no WhatsApp às 19h21.
Cerca de 40 minutos depois, a estudante ainda está travada no trânsito da Dutra, na altura do centro de Guarulhos.
“O trânsito já começa nessa entrada do outlet ‘Só Marcas’, na altura da Aché e Viaduto Cidade de Guarulhos. Não tem um dia bom quando se trata desse trechinho. Todo dia é engarrafamento”.
O trecho ao qual Aninha se referia era no km 221, na pista lateral, sentido Rio de Janeiro. Um ponto caótico para o guarulhense.
Ana Adriely, que saiu de casa antes das 6h, chegou de volta ao lar somente às 20h55. Foram 15 horas fora, sendo quatro delas no estágio, cinco na faculdade e o restante basicamente enfrentando a dura realidade de deslocamento de quem mora na periferia de Guarulhos e trabalha/estuda em São Paulo.
*João Vitor Reis é jornalista formado pela Unesp Bauru e já colaborou com publicações como Agência Mural e Folha de S.Paulo.
Esse texto é o segundo de uma série de reportagens que o Guarulhos Todo Dia publica sobre “A dura rotina” de quem mora em Guarulhos, trabalha em São Paulo e depende do transporte público.
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