Sem arranha-céus, Guarulhos cresce com condomínios populosos e bairros verticalizados

Reportagem do Guarulhos Todo Dia detalha o processo de verticalização da cidade e explica as regras que as construtoras seguem para a construção de prédios.

Vinícius Andrade

redacao@guarulhostododia.com.br

Empreendimento Cidade Maia: um bairro planejado em Guarulhos (Foto: Eztec/Divulgação)

Publicado em 19/05/2025 às 07:00 / Leia em 8 minutos

A construção de arranha-céus na orla de Balneário Camboriú, em Santa Catarina, tem chamado a atenção por causa da altura cada vez maior dos prédios. A Senna Tower, que terá mais de 150 andares divididos em um edifício de cerca de 500 metros de altura, deve começar a ser construída ainda neste ano no município catarinense. Será o prédio mais alto do Brasil. Guarulhos, por causa das regras da lei de zoneamento, do aeroporto e pelo próprio perfil urbanístico, não tem construções que podem ser classificadas como arranha-céus. No entanto, o processo de verticalização por aqui é intenso e acontece da sua própria maneira.

Os lançamentos de grandes empreendimentos residenciais em território guarulhense ficou mais intenso entre o fim dos anos 2000 e o início dos anos 2010. Foi justamente nessa época que aconteceu a construção do megacondomínio Único, na Ponte Grande, o maior da cidade de Guarulhos. São 17 torres de 17 andares, com oito apartamentos por andar, que foram vendidos pelo Minha Casa, Minha Vida.

São mais de 2.300 unidades habitacionais e uma população que gira em torno de 5 mil a 7 mil moradores. É uma verdadeira cidade. Para se ter uma ideia, de acordo com dados do IBGE divulgados em 2024, 23,1% (1.288) dos 5.570 municípios brasileiros têm menos 5 mil habitantes. A administração de um empreendimento como o Único é tão complexa que existe até um canal do YouTube para a síndica passar comunicados aos moradores. O condomínio ainda tem subsíndicos e grupos no WhatsApp.

O lançamento de um empreendimento com centenas de unidades gera um impacto direto para o quarteirão e para o bairro onde ele é erguido, pois são milhares de pessoas que passam a morar onde antes havia algumas poucas casas ou um terreno vazio. Numa escala maior, altera também a dinâmica da própria cidade.

Condomínio Único, em Guarulhos, é o mais populoso da cidade e fica na estação Ponte Grande
Condomínio Único, na Ponte Grande, tem 17 torres residenciais (Foto: Bueno Drone/Guarulhos Todo Dia)

Em entrevista ao Guarulhos Todo Dia, o professor, arquiteto e urbanista José Carlos Guerra cita que a “outorga onerosa” de Guarulhos poderia ser aprimorada –essa é uma contrapartida que construtoras e incorporadoras pagam à cidade quando há interesse em construir edificações acima dos limites construtivos básicos definidos. O especialista, que coordena os cursos de Engenharia Civil e Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Eniac, explica que na capital paulista esse dinheiro é direcionado para o Fundo de Desenvolvimento Urbano (FUNDURB).

“Esse fundo urbano decide para onde esse dinheiro vai”, explica Guerra. O recurso deve ser aplicado para a implantação de diversas melhorias na cidade de acordo com o Plano Diretor, como programas de habitação social e qualificação da mobilidade.

“O edifício causa um impacto. Esse dinheiro da outorga onerosa deve ser revertido para remediar esse impacto, como, por exemplo, a largura das vias, o alargamento das vias. A gente fala muito das vias porque as vias é o que a gente vê, mas o maior impacto tá lá no sistema de esgoto, no sistema de água que tá embaixo da terra e que ninguém vê. Então, realmente deve ser cobrado esse valor e isso ser revertido para a infraestrutura local.”

José Carlos Guerra, arquiteto, urbanista e coordenador no Centro Universitário Eniac

O fato de o trânsito dentro de Guarulhos ter piorado tanto nos últimos anos não é obra do acaso. A população cresceu e a frota de veículos particulares cresceu, mas as principais avenidas e acessos continuam praticamente do mesmo tamanho. Além disso, o transporte público não teve avanços significativos. As linhas do Metrô previstas para atender aos guarulhenses, por exemplo, só devem ficar prontas depois de 2030.

A lei de zoneamento de Guarulhos, de 2021, diz que as contrapartidas financeiras pagas à prefeitura para a construção de empreendimentos que desejam ter potencial construtivo adicional deve ser direcionada ao Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano para melhorar a infraestrutura da cidade. Porém, ao que parece, essa destinação precisa ser aprimorada.

Os ‘bairros de prédios’ em Guarulhos

Perto da Ponte Grande, onde fica o Único, outros dois bairros têm se verticalizado em ritmo acelerado: o Itapegica, no entorno do Internacional Shopping, e a Vila Augusta. Não é preciso andar muito por essas regiões para identificar prédios subindo e empreendimentos sendo lançados. Ruas como a estreita Santa Izabel viraram praticamente vias de condomínios com prédios.

Aya, empreendimento da Vegus na Vila Augusta
Aya, empreendimento de alto padrão que está sendo construído na Vila Augusta (Fotos: Vegus/Divulgação)

Nessa mesma região, existem condomínios com centenas de unidades, mas com apartamentos maiores e voltados para famílias da classe média alta, como o Parque Clube, o Suprema e o Hellbor Enjoy Guarulhos, todos já prontos.

Um novo bairro de prédios também se formou em Guarulhos na última década, no entorno do Parque Shopping Maia. A avenida Bartolomeu de Carlos, a rua Dona Tecla e a avenida Salgado Filho foram tomadas por empreendimentos residenciais. Um exemplo é o Cidade Maia, construído em um terreno anexo ao shopping. São condomínios com 1.969 unidades dispostas em nove diferentes torres.

Do outro lado da cidade, com ligação direta ao Shopping Bonsucesso, está sendo construído o Lazer & Vida Bonsucesso, um condomínio clube com 800 unidades. É vendido como o “único Minha Casa, Minha Vida do Brasil com acesso a shopping”.

O urbanista José Carlos Guerra é favorável ao processo de verticalização, mas ressalta que é necessário fazer investimentos na infraestrutura dos bairros que passam por esse processo. A contrapartida tem que ser bem usada. “Por uma lógica de infraestrutura, de preservação do Meio Ambiente, de qualidade de cidade, nós realmente deveríamos verticalizar. Tem muitos arquitetos urbanistas que são contra a verticalização, mas eu sou a favor”, diz o especialista.

“A gente tá se multiplicando e se a gente continuar construindo casa, casa, casa, daqui a pouco não tem mais Serra da Cantareira, daqui a pouco não tem mais Serra do Mar. Então, num terreno, num lote de 1000 m², onde você tinha, sei lá, uma família morando, agora você passa a ter 500 famílias. Então, por essa lógica, realmente a verticalização é muito mais interessante”, reforça o coordenador dos cursos de Engenharia Civil e Arquitetura e Urbanismo do Eniac.

Altura dos prédios em Guarulhos

Em nenhum desses grandes lançamentos de empreendimentos realizados na última década em Guarulhos, as construtoras usaram a chamada publicitária de o “prédio mais alto de Guarulhos” como argumento para venda. Não existe um registro claro de qual é o prédio mais alto da cidade.

Os empreendimentos com mais altura têm entre 20 e 30 andares, ou seja, nada que vá muito além dos 100 metros. Para ser considerado um arranha-céu, o prédio precisa ter, no mínimo, 150 metros de altura. Na capital paulista, atualmente o prédio mais alto é o Platina 220, que fica no Tatuapé: tem 172 metros de altura e 46 andares. No entanto, o edifício será superado em breve pelo Paseo Alto das Nações, que está sendo erguido na zona sul de São Paulo, e terá 219 metros de altura.

Platina 220, o prédio mais alto da cidade de São Paulo, tem 172 metros de altura e 46 andares
Platina 220, o prédio mais alto da cidade de São Paulo fica no Tatuapé (Foto: Porte Engenharia)

A presença do Aeroporto de Guarulhos causa limitações na altura dos prédios de alguns bairros do município. As regras que devem ser observadas em zonas aeroportuárias brasileiras constam no Plano Básico de Zona de Proteção de Aeródromo (PBZPA).

De acordo com Portaria de 2015, em um raio de quatro quilômetros a partir da cabeceira da pista, a limitação de altura dos edifícios, que era de 75 metros, passou a ser de 45 metros de altura, o equivalente a um prédio de 15 andares. Por isso, você nunca (ou enquanto houver aeroporto) vai ver prédios muito altos sendo construídos em bairros como Taboão, Vila Barros e Seródio.

“Em Guarulhos, a altura máxima dos edifícios está relacionada à altura do nível do mar. Então, o nível do mar é zero. Guarulhos está a uma altitude de cerca de 780 metros, dependendo da região. A cidade pode construir até 870 metros acima do nível do mar. Dependendo de onde você está na região de Guarulhos, você tem esse limite de altura”.

José Carlos Guerra, arquiteto, urbanista e coordenador no Centro Universitário Eniac

A lei de zoneamento de Guarulhos indica a “Zona de Uso Diversificado 1” (ZUD 1) como o local da cidade “onde o limite de gabarito de altura imposto pela presença do aeroporto é menos restritiva do que no restante da cidade, onde se permitirá a maior densidade construtiva”. Essa ZUD 1 (em marrom, no canto esquerdo baixo do mapa) pega a região da Vila Augusta e da Ponte Grande, conforme pode ser visto no mapa abaixo:

Mapa de zoneamento de Guarulhos de 2021
Mapa publicado no Diário Oficial de Guarulhos em 19/1/2021, com a lei de zoneamento

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